sexta-feira, 21 de novembro de 2008

PROMOÇÃO!!!!!!!

Envie uma frase para o e-mail pararealidade@gmail.com . Respondendo:


Se você fosse um dos personagens desse blog, quem você seria e por quê?


O autor da melhor resposta ganhará uma camiseta do pararealidade. Não esqueça de enviar no final do e-mail o tamanho de sua camiseta.



quarta-feira, 19 de novembro de 2008

O tradicional vendedor ambulante do parque da Redenção.


Quando eu era pequena sempre passava por ele e ficava admirando os seus balões. Jamais imaginei que 15 anos depois eu iria entrevistá-lo, muito menos que ele ainda estaria vivo.

Na época ele vendia bolas gigantescas que uma criança mal conseguia segurar. Lembro que em uma tarde, minha mãe comprou um de seus balões. Era um peixe enorme, mais parecia uma carpa. Tinha tanto gás que ele flutuava contra o céu azul. Ele amarrou o barbante no meu pulso e eu voltei saltitante para casa.

Tudo isso durou pouco, o barbante soltou do meu pulso e o peixe foi voando em direção a uma árvore e logo depois para o céu. Eu gritava e chorava: - Mamãeeeeee...pega um avião e vai buscar meu peixe, não quero que ele nade no céu. Ele não sabe nadar no céu, ele vai MORRERRRR.

Gentilmente minha mãe se abaixou para ficar do meu tamanho (sim, já fui baixinha um dia), passou a mão na minha cabeça e falou: - Calma Bruna, domingo que vem te dou outro balão.

Minha mãe não entendia o que aquele peixe, em poucos minutos, representou na minha vida *rsrsrs, - crianças sempre exageram um pouco - e eu entendia muito menos quando seria domingo que vem. Eu estava programando altos papos com ele quando chegasse em casa. Assim ela (minha mãe) poderia ler o seu jornal sem a minha interferência, e eu conversar com meu amigo peixe em paz.

E assim, fomos caminhando devagar em direção a nossa casa, em um domingo quente de verão, com a brisa batendo em nossos rostos. Logo eu troquei meu amigo peixe por um delicioso sorvete.

Juares da Silva Oliveira, 76 anos, nasceu em Porto Alegre e com apenas três anos de idade perdeu sua mãe. Seu pai casou-se novamente. Por isso, estudou somente até a terceira série, tendo que parar para poder trabalhar. Há 59 anos está na Redenção atuando como vendedor de balões. Juares garante ser o primeiro morador de rua de Porto Alegre, em 1946; ele dormia sozinho no viaduto da Borges de Medeiros com apenas 14 anos.


Pararealidade: Quanto tempo você trabalha com balões?
R: Há 59 anos. Comecei com 17 anos na parte dos macaquinhos da redenção. Lá do outro lado. Era onde havia a maior concentração de crianças.

Pararealidade: Com o que você trabalhava antes de trabalhar com balões?
R: Já trabalhei em uma fábrica de vidro, fábrica de calçados. Em uma dessas fábricas eu fui despedido porque um colega meu veio brigar comigo de faca, me cortou e eu sangrei muito. O dono da fábrica disse que iria demitir o agressor e eu porque sangrei. Vê se pode.

Pararealedade: Como surgiu a idéia de trabalhar com balões?
R: Essa idéia surgiu porque eu via que dava dinheiro.

Pararealidade: Qual o seu faturamento diário?
R: Eu consigo tirar um salário mínimo e meio por domingo. Quando chove é um caos porque deixo de ganhar.

Pararealidade: O que o senhor faz durante a semana? Trabalha em outro lugar?
R: Durante a semana eu dedico o meu tempo na fabricação de cata ventos para vender aos domingos.

Pararealidade: Você tem família? Filhos? Quantos ajudam você aqui na redenção?
R: Sim. Tenho mulher e ao todo são 15 filhos vivos. Uns quatro somente ajudam aqui.

Pararealidade: Dá para sustentar todos da sua família e conseguir sobreviver ao mesmo tempo?
R: Antigamente eu ganhava muito mais. Hoje as vendas caíram 80%, mesmo assim, vale a pena. Agora tenho filhos maiores, alguns já trabalham e já constituíram famílias. Fico triste porque só um vai conseguir se formar no colégio, os outros abandonaram. Eu continuo com esse negócio porque não vou conseguir arrumar outro serviço.


Pararealidade: Se o senhor não trabalhasse com balões, com o que gostaria de trabalhar?
R: Com essa idade que eu estou agora, acho que eu deveria montar uma fruteira para mim e parar um pouco de trabalhar na rua e de viajar.

Pararealidade: O senhor costuma trabalhar com os seus balões em outros lugares sem ser a redenção?
R: Sim. Na festa da uva, festa da soja, festa do vinho, expointer. Teve uma época que na feira da uva e na do vinho consegui ganhar 130 mil reais. Eu sempre fui muito festeiro, gastei tudo com churrasco, convidei muitas pessoas.

Pararealidade: Mas porque o senhor não guardou todo esse dinheiro para garantir um futuro melhor?
R: Toda vida fui festeiro. Eu tendo dinheiro é churrasco e festa pra todo mundo. Não adianta nada ficar com dinheiro, a gente vai morrer e não vai levar nada. Vou deixar para meus filhos brigarem?? é melhor gastar, comer, beber e se divertir.

Pararealidade: Você paga alguma coisa para ficar na redenção?
R: Absolutamente, nada.

Pararealidade: Como o senhor faz para transportar esse carrinho cheio de balões? R: Esse carrinho eu guardo na Venâncio Aires. Ali tem uma farmácia. Nos fundos da farmácia, do lado, tem um lugar que guarda carros e eu guardo o meu ali. Faz quatro anos que guardo meu carro ali e nunca deu nenhum tipo de problema. Pago 75 reais por mês.

Pararealidade: Qual a idade das crianças que compram os seus balões?
R: Tem crianças de um ano e meio de idade que passa e já pede para os pais. Então eu diria de um ano e meio de idade até crianças de 12 anos.

Pararealidade: Qual a média de preço dos balões?
R: Nós vendemos os mais simples por 10 reais, no shopping eles vendem por 20, 25 reais. O que eu vendo muito são os cata ventos. É uma fabricação minha, em média custam quatro reais, depende do cata vento. Se eu pegar uma garrafa de pepsi eu consigo fabricar dois cata ventos e lucro em torno de oito reais. O cata vento de plástico é mais resistente, não arrebenta.

Pararealidade: Qual o balão que mais vende?
R: O avião da TAM vende muito. Depois o Homem Aranha e a Moranguinho.

Pararealidade: Quais os meses que mais te dão lucro?
R: De Maio a Outubro, principalmente no dia das crianças. O movimento para um pouco nas férias. Procuro ir para a praia trabalhar.

* AVISO: É terminantemente proibido roubar as fotos deste blog sem autorização prévia. Caso você ouse fazer isso, você terá um repentino aneurisma cerebral...em...5...4....3...2...1 . Prazer em conhecê-lo.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Série travestis - uma nova perspectiva

Maria Berenice Dias, ex-desembargadora e hoje advogada, nos conta
neste vídeo histórias interessantíssimas sobre casos homoafetivos que
já defendeu e demonstra ser uma pessoa muito acessível, sem se
preocupar com o preconceito da sociedade.

Não deixem de conferir o vídeo "Entrevista com Maria Berenice Dias" -
ele encerra a série travestis do pararealidade




* Editado por Dieines Fróis.

* Fotos de Maria Berenice Dias, clique aqui.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Série travestis - enfrentando o preconceito


Bruna Torres nasceu no interior do Rio Grande do Sul. Aos 22 anos mudou-se para Porto Alegre. Tornou-se travesti aos 15 e na mesma época passou a tomar hormônios. Ao completar 18 anos começou um curso de cabeleireira, que a ajudou no que é hoje, pois trabalha em uma estética durante o dia e à noite como profissional do sexo. Além disso, ela tem um anúncio na Zero Hora dominical, através do qual atende seus clientes em um lugar próprio. Bruna possui um blog onde deposita fotos eróticas, e o nome que utiliza para exercer essa profissão é Camila Oliver.

Pararealidade: Como você descobriu que era diferente dos demais?
Foi na época de colégio, quando eu comecei a gostar de um menino. Na minha cabeça eu não tinha nada formado sobre o que era certo e o que era errado, mas eu sabia que era diferente, porque pelas conversas que eu ouvia de mãe e de parentes aquilo era estranho. Na minha rua tinha um homossexual já de mais idade e eu tinha apenas 11 para 12 anos e achava que não era errado. Na época eu já gostava de um menino do colégio.

Pararealidade: Você já sofreu abuso sexual?
Sim, duas vezes. Uma foi bem curiosa, porque aconteceu na delegacia de polícia na minha cidade natal, Rio Pardo, conhecida por todos, histórica pela famosa Sexta-feira Santa e pela igreja também. Eu fui chamada ao passar pela calçada. O cara me levou para dentro da delegacia, acho que ele não era delegado. Aí, abriu a calça e me obrigou a fazer sexo oral nele. Como eu deveria ter meus 12, 13 anos, nunca contei aquilo para ninguém. Não fiz queixa, não fiz nada porque eu nem imaginava que fosse possível. E, passado um tempo, sofri abuso mesmo: eu estava saindo do cinema e - sabe como é cidade do interior - fui cortar caminho por dentro de um campo. Aí um cara me pegou a força, me fez fazer sexo com ele a força. Foram essas as duas vezes. Isso aconteceu quando eu era adolescente, menor de idade, tudo ficou em segredo comigo. Hoje em dia isso não acontece mais. Impossível. Ninguém mais pega uma travesti a força. Eu era um adolescente, crianças correm todos os tipos de perigo, como se vê todo dia em notícias na TV e nos jornais.

Pararealidade: Como você reage quando o assunto é Aids? Você tem algum receio?
Sim. Eu venho da época em que iniciou. Quando começou, na década de 80, eu me reunia na esquina com os meus amigos gays (na época eu não era travesti ainda, eu era gay), e começamos a ouvir notícias de que em são Francisco surgia o câncer gay - era assim que chamavam. Eu presenciei todo o processo da Aids.

Pararealidade: Você já teve amigas que morreram por estar com o HIV?
Várias. Houve uma geração de travestis mais antigas e a grande maioria morreu por causa do HIV. Hoje, travestis na faixa de 40 a 50 anos são muito poucas.

Pararealidade: Os teus clientes costumam pedir o seu teste de HIV antes de fazerem o programa?
Os clientes costumam perguntar se nos cuidamos, mas sempre faço os programas usando preservativo. Faço o teste do HIV uma vez por ano, geralmente é em dezembro.

Pararealidade: Como é o dia-a-dia de uma travesti, hoje? O que poderia mudar?
O que realmente poderia mudar o nosso dia-a-dia é se houvesse mais leis que abrangessem esse tipo de público. Porque é muito fácil tu ser gay e ser lésbica. Até em salão existe o preconceito. A cliente adora ser atendida por um gay de cavanhaque, bem fresco, bem desmunhecado. Se ela chega no salão e vê uma travesti, com peito, bunda, silicone e com marquinha de biquíni, já tem problema. Se ela não é cliente, se ela é nova, muitas olham meio atravessado. Começam com muitas curiosidades em cima. Elas não se preocupam se você é boa no seu trabalho, elas se preocupam com a tua vida. Com quem tu sai, com quem tu dorme, transa, como é que tu vive, se tu operou, se tu não operou. Esse tipo de informação não chega à casa das pessoas. Quando uma novela mostra uma travesti, mostra um ator de peruca vestido de mulher, sempre caricato. Todo tipo de trabalho na TV que mostrou travestis mostrou um ator vestido de mulher, e na verdade não é isso. Eu sou assim da hora que acordo até a hora de dormir. Eu não me monto.

Pararealidade: Como você reage ao preconceito da sociedade?
A cada dia a gente mata um leão para viver. Essa é a verdade da travesti. Hoje, o preconceito da sociedade funciona assim: se eu estiver em um lugar público e sofrer preconceito, eu sei que tenho os meus direitos a procurar. Posso fazer uma ocorrência policial, posso ir ao Ministério Público, hoje em dia eu sei disso. Mas o preconceito se mostra no dia-a-dia sempre. Se alguém falar algum dia que o preconceito diminuiu, não é verdade. Existe em todo local.

Prarealidade: E você acha que daqui a dez anos isso vai melhorar?
Não, se continuar como está hoje, acredito que não. As ONGS lutam, nós nos reunimos, fazemos pontos por nossos direitos. Mas fora daquela sala as coisas não andam.

Pararealidade: Quais são seus projetos futuros?
Dentro da ONG eu participo de vários encontros regionais e nacionais. A nossa luta sempre abrange o preconceito, esse é sempre o grande problema. Seja dentro de casa, agressões por policiais... O outro grande preconceito que eu acho que se torna um pouquinho esquecido é quanto ao portador de HIV, a pessoa soropositivo tendo que viver com a Aids. Aí vem um preconceito imenso. Eu trabalho dentro de uma estética, com pessoas de classe média alta, e toda vez que se toca no assunto que o tal cabeleireiro está com HIV, aquele cabeleireiro perde a clientela. Se vê um gay ou uma travesti fazer a tua unha, já surgem as perguntas se tudo é bem esterilizado. Claro, tudo é bem limpo, mas sempre as pessoas ficam preocupadas com isso. Então, quem é soropositivo ainda sofre muito preconceito e aí está um dos nossos trabalhos: enfrentar esse tipo de preconceito.

* Foto retirada do blog pessoal de Bruna Torres.